Ricardo Silva comunica paralisação da sua carreira

O nosso correspondente Ricardo Silva escreveu a seguinte comunicação:
Venho através desta carta eletrônica comunicar a paralisação da minha carreira como assessor de imprensa por tempo indeterminado.
 
Devido à problemas estritamente pessoais, me desgastei nas minhas funções. Não tenho mais qualquer ânimo para fotografar, escrever, montar/editar páginas de internet, fazer vídeos, entre outros. Estou também interrompendo atividades paralelas que eu mantinha no futsal amador, no qual já fui técnico, auxiliar e diretor de clubes.
 
Gostaria de deixar claro que os meus atuais clientes (Kurdana/Cotia, Liga de Futebol Amador de Osasco, Dany Domingos e Nove Futsal Feminino) não possuem qualquer relação com esta decisão. Todos eles honraram seus compromissos financeiros para comigo, mostrando serem sérios e honestos.
 
O desgaste se deve ao transtorno afetivo bipolar, o qual foi diagnosticado há cerca de dois anos e meio. Porém, eu já apresentava quadro de depressão desde os 14 anos. Hoje estou com 32 anos - ou seja, convivo cansativamente com esta baixa de humor em mais da metade da minha vida.
 
Embora os especialistas afirmem que, se medicados, os bipolares podem levar uma vida perto do considerado normal pela sociedade, digo por experiência própria que não é tão fácil assim. Me descontrolei na medicação várias vezes, chegando a me viciar em algumas delas - a ponto de tentar suicídio por duas vezes. As alternâncias entre euforia e depressão são cansativas, alterando o meu senso crítico e comprometendo o meu trabalho. Levantar-me a cada tombo é exaustivo, chegando uma hora que isso desgasta demais. Fora o preconceito da sociedade com o portador de uma doença da psique - embora vivamos uma época brindada com a Lei da Reforma Psiquiátrica (a mesma completou 10 anos neste 2011), fui constantemente vítima de zombarias e agressões verbais, e até físicas.
 
Todo esse cenário me desestimulou a trabalhar. Todos sabem dos meus sumiços repentinos, de alguns dias sem publicar materiais, sem responder e-mails ou atender ligações. Apenas vinham cobranças e mais cobranças - especialmente daqueles que se aproveitavam dos materiais que eu montava sobre os meus assessorados e que ganhavam financeiramente com isso de fontes outras, sem que eu recebesse um centavo a mais. Mesmo assim, quando voltava, procurava provocar uma enxurrada de e-mails, com textos longuíssimos e dezenas de fotos.
 
No momento, tenho que fazer tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com profissionais (especialmente no caso dos médicos) desinteressados em dar um atendimento de qualidade e fazer saúde pública. Mas, mesmo quando eu tinha tratamentos particulares, o resultado era ineficaz. A Medicina em nosso país, vista como a profissão mais importante, na verdade é, para os médicos, uma fonte inesgotável de dinheiro às custas do sofrimento dos pacientes.
 
Não vejo mais qualquer utilidade e importância no meu trabalho. Não sinto mais prazer com ele e vejo que outros se aproveitam do mesmo bem mais do que eu. Embora eu tive apoio dos meus atuais clientes em momentos difíceis, não consegui ter ânimo para continuar.
 
E afirmo, apesar da cordialidade e honestidade dos meus clientes, não vejo mais condições em exercer os serviços de forma minimamente satisfatória. Opto por paralisar minhas funções antes que elas mostrem uma deterioração excessiva do meu trabalho. Como diria Neil Young em uma canção que eu gosto muito, "It's better to burn out than to fade away" (É melhor queimar do que se apagar aos poucos).
 
Não tenho qualquer condição de dar qualquer continuidade aos meus trabalhos. Desde o dia 06 de novembro estou trancado em casa, falando raras vezes com alguns interlocutores e mal fazendo minhas tarefas domésticas, sendo que eu moro sozinho desde abril último. Creio que outros terão bem mais capacidade de realizar os serviços que inciei a contento do público. Haja visto que ninguém é insubstituível em diversas instâncias das nossas vdas, especialmente no tocante profissional. Eu estive parado esses dias mas a vida continuou, o mundo girou e outras pessoas deram boa continuidade às minhas funções, mostrando que não sou imprescindível como assessor de imprensa.
 
Pode ser que, futuramente, eu consiga voltar à exercer as funções que estou paralisando. Entretanto, mesmo se eu voltar, sei bem que os trabalhos não estarão esperando por mim. Outras pessoas estarão no meu lugar e não terei posições destinadas à mim. O que é justo. Não adianta eu ir para a guerra e esperar que a casa, depois de anos, esteja do mesmo jeito.
 
Não sei o que farei profissionalmente daqui em diante. Possuo outras capacitações. Sou terapeuta ocupacional formado pela USP com especialização em gerontologia na PUC. Além disso, já trabalhei de recreador e até mesmo, acreditem, de tarólogo. Sei que zombarão ao ler isto, mas não estou mentindo. Entretanto, neste momento, nem estou conseguindo colocar em prática as minhas capacidades anteriores - muitas das quais eu já não gostava mais. Mal tenho ânimo para cuidar de mim mesmo.
 
Acredito que, ao menos até o final de 2011, estarei sem fazer atividade alguma, procurando me tratar e me reencontrar. Se eu conseguir ao menos encontar a mim mesmo novamente, conseguirei escolher e fazer uma atividade com satisfação, correção e qualidade. Não sei qual - talvez até diferente das que eu já fiz. Eu amava o que fazia, mas acredito que vou demorar a recuperar esse amor e dedicação pela imprensa esportiva, ou até mesmo pela vida que eu levei nos bastidores do esporte. Mudo de profissão e os problemas pessoais continuam porque não consigo solucioná-los. Até mesmo porque ninguém me ajuda de fato, como eu realmente quero e preciso.
 
Não peço qualquer aprovação ou compreensão frente à minha decisão. Apenas peço que a respeitem e não fiquem forçando uma retomada. De nada é útil voltar a exercer as minhas funções com discutível qualidade.
 
Não quero dar espaço aos meus inimigos e aos aproveitadores que ajudaram neste desgaste. Ainda tenho o gosto amargo da falta de reconhecimento do meu trabalho exercido por quatro anos em outro clube - o qual se aproveita disso em termos de mídia e divulgação até hoje, deixando de pagar a dívida que tem comigo. Trabalho que foi exaustivo e sempre desvalorizado por eles próprios, sempre pedindo mais. Clube este que vence de forma irregular competições, prejudicando a imagem da modalidade, e não honra seus compromissos com atletas e comissão técnica. Carrego ainda, em outro trabalho, o desgosto de ser achincalhado em uma final de competição, quando o mal-remunerado assessor de imprensa passou a ser um incômodo representante de clube, sendo a entidade conivente com os impropérios proferidos por um certo árbitro - uma infeliz exceção entre profissionais que, em sua grande maioria, me auxiliaram bastante nas tarefas de quadra. Sofri também, tanto no futsal amador quanto na imprensa esportiva, com falsas amizades e traições inúmeras.
 
Finalizo esta carta eletrônica parabenizando o excelente desempenho da Kurdana/Cotia no futebol feminino e vôlei masculino dos Jogos Abertos do Interior, a vice-artilharia de Dany no futsal feminino espanhol e a liderança de seu clube, o posicionamento do Nove Futsal Feminino entre as oito melhores equipes dos Jogos da Cidade de São Paulo, bem como o sucesso das competições que o clube está organizando, e o momento próspero da Liga de Futebol Amador de Osasco. Todas e todos vocês provaram a minha teoria de que os vencedores na vida triunfam também dentro das quadras e campos. No caso da Kurdana, o trabalho sólido e sério no futsal foi transplantado para o futebol com perfeição, mostrando alto nível e plenas condições de vencer as equipes tradicionais de campo, saindo com um vice-campeonato invicto, não devendo em nada para os times do Paulistão. No vôlei, a recuperação após uma derrota até o momento do triunfo, com um belíssimo bicampeonato. Com Dany, a vitória pela insistência e esforço, mesmo quando todas as portas se fecham e as críticas são injustas. No Nove, a demonstração de que algo amador, ou em tempo parcial, pode ter seriedade e gerar brilhantes resultados. Por fim, na liga de campo da minha cidade-natal, a possibilidade de uma reviravolta organizacional quando ninguém acreditava que aconteceria um dia, numa entidade apontada como confusa e bagunçada - hoje, qualificada, séria e respeitável, sem deixar a alegria da bola nos pés de lado. Todos vocês são vencedores mais que encaminhados. Sinto que, mesmo que pouco, contribuí nisso.
 
Não sei se eu os reencontrarei. Por hora, um 'até breve', na incerteza de retorno desta paralisação - que pode ser definitiva.
 
Sem mais,
Ricardo Silva

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